Disse-me o Bruno que tinha a vantagem de pelo menos nao viver em Portugal que é um pais deprimente. Concordo plenamente, mas às vezes pode ser deprimente tambem aqui em Roma.
No Porto, uma das minhas cidades de origem, existem revisores nos autocarros. Em Roma nao; toda a gente anda sem pagar, e (muito) de vez em quando é apanhada pelo pica, que mesmo assim com uma boa historia deixa passar a multa. Passando por cima de toda a questao de um serviço publico ser assim clamorosamente mal gerido, ha' um problema ainda maior: os autocarros nocturnos sao autenticos dormito'rios para os sem-abrigo. Ainda noutro dia apanha'mos um desde a estaçao até casa, às quatro da manha - e havia pessoas com mantas e mochilas, a ocupar dois lugares cada uma. E um cheiro indescritivel (começa a estar calor a sério por aqui) e o autocarro cheio de gente que nao se podia sentar e quase respirar. E ainda por cima, quando me lembrei de protestar que nao havia direito, ainda levei com um "nunca se sabe quando sera' a tua vez de precisares de dormir nos autocarros" da minha cara amiga Luisa.
Nao acho que hoje em dia so' é sem abrigo quem quer (como a outra senhora), mas custa-me ver um Estado que trata os seus cidadaos como animais: os que pagam e usam os transportes publicos, e os que os usam como casa e que nao tem mais para onde ir.
Em Roma cada vez mais a populaçao é constituida por funcionarios do aparelho de Estado, bem pagos e com rendimento para toda a vida, e por pedintes miseraveis, ignorados nos autocarros porque o que importa é nao fazer ondas. Nao é so' Portugal que é deprimente.
28 de abril de 2005
viver em Italia; os autocarros-abrigo
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27 de abril de 2005
posto pelo Alexandre às 17:48 0 comentários
porque nao sou ateu
titulo inspirado pelo Bertrand Russel
Pelas mesmas razoes que nao sou cato'lico. Um cato'lico acredita, tem fé, melhor sente a fé, coisa que nao me acontece. Procuro uma explicaçao racional para as coisas que acontecem à minha volta, e quando ela nao existe, contento-me com isso e claro, com a esperança (que nao fé) no progresso e ampliaçao do conhecimento humano, logo com a possibilidade de uma soluçao. De um modo Popperiano, os problemas e as soluçoes sucedem-se consecutivamente numa espécie de cadeia; quando nao se encontra uma soluçao, por vezes é preciso voltar atra's na cadeia e eliminar ou reformular soluçoes precedentes (foi o que aconteceu com a teoria da relatividade). Logo, nao ha' dogmas - tudo pode ser refutado, desde que o seja de uma modo racional (2+2=4) e que proponha uma nova soluçao, melhor que a anterior. Ora, se nao ha' dogmas, tambem nao ha' ateismo, ja' que este acredita que Deus nao existe, enquanto que para um agno'stico (como eu) a sua existencia nao esta' provada racionalmente. A diferença entre um e outro nao é tao pequena quanto isso. E' a diferença entre fé e razao.
posto pelo Alexandre às 14:36 2 comentários
O direito à arquitectura 2
É a falácia corporativista da nossa Ordem. Toda a gente devia poder assinar um projecto, desde que cumpra a lei. E esta deve ser o menos restritiva possível, de maneira a assegurar a qualidade de construção e a não destruição da paisagem natural/urbana (o que já não é pouco, e de qualquer maneira ainda não existe). Não discuto se o RGEU deva ser alterado, melhorado, etc., mas a verdade é que para fazer um projecto que o cumpra não é preciso andar seis anos a estudar, nem deve. Isto porque numa sociedade que se quer livre (e para mim mais liberal...) não se pode obrigar ninguém a pagar a um arquitecto para ter um projecto putativamente melhor (aliás, sabemos todos que não é sempre o caso). Quem paga a um arquitecto deveria fazê-lo apenas por querer ter um valor acrescentado, uma qualidade “erudita” e não “popular”. Mas se quiser ter o popular, por que raio é que se deve impedi-lo? A não ser por um saloio e provinciano corporativismo proteccionista, aquilo que lentamente e cada vez mais está a afundar o nosso país.
posto pelo Alexandre às 12:09 2 comentários
26 de abril de 2005
Para uma definiçao: o direito à arquitectura
é exactamente o direito a ter a arquitectura que se quiser. Nem o Estado nem a Ordem dos Arquietctos devem meter o nariz. Isto em relaçao à revogaçao do 72/73, que como ja' li algures no site da Ordem é "desejada por todos os arquitectos". Com licença... Ainda nao posso usar o titulo de Arquitecto (embora ja' tenha a licenciatura e graças a mais uma brilhante medida da Ordem, o esta'gio curricular) mas eu, pelo menos, nao a desejo.
A exclusividade, para os arquitectos, de assinar projectos de arquitectura so' significa uma coisa: que em vez de se esforçarem para sair da miséria em que se encontra a profissao, preferem refugiar-se em medidas proteccionistas e anti-liberais. De volta à Idade Média.
E nao, nao é linear que so' os arquitectos possam fazer arquitectura. Alias, sempre foi assim; o que é a Arquitectura Popular senao Arquitectura feita por nao-arquitectos? Nao vale defender o Inquérito à Arquitectura Popular por um lado e por outro recolher assinaturas contra aquilo que ele representa: que é como quem diz, vai ser popular, mas la' para a tua terra. Ou seja, alem de anti-liberal, é profundamente elitista defender a revogaçao do decreto.
posto pelo Alexandre às 18:06 3 comentários
cena'rio
esta é daquelas que devia ter ido parar a outro lado qualquer e, como nao foi utilizada, ponho-a aqui. E' um tipico remake da Scena Tragica, do Serlio, e devia estar no cartaz da peça "Entristecer" da aldeia da Castanheira.
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a semana passada
foi do piorio. Sempre a trabalhar. Esta, espero postar alguns comenta'rios à realidade, especialmente umas farpas à nossa Ordenzinha.
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13 de abril de 2005
frases miticas da Escola
A implantaçao depende da altura do rodapé.
Uma lenda, esta, do nao menos lenda'rio Rocha. A ideia de que o projecto é um puzzle modular no qual cada dimensao se relaciona geometricamente com as outras nao é mais do que aquilo que o Alberti ou o Palladio diziam (e faziam). Foi tambem a primeira vez que ouvi alguem na Escolinha falar de como se fazia arquitectura, e nao de cliches como os enfiamentos, as afirmaçoes, o fazer ou nao sentido, o agarrar-se ao terreno etc. Estes lugares comuns abundavam tanto que, no primeiro ano, num daqueles textos que era preciso escrever para "justificar" o projecto, usei-os todos de propo'sito. (na verdade de certeza que ainda abundam) (nao quer dizer que se deva fazer arquitectura assim, mas quando se é estudante, nao se sabe a ponta dum corno e toda a gente à nossa volta fala de questoes eso'téricas ajuda bastante).
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palavras romanas
piottare - conduzir depressa. Havia ha' uns anos um cantor pimba chamado Er Piotta.
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8 de abril de 2005
para uma definiçao de arquitectura
em resposta ao desafio do Tiago. Começo com o unico projecto realizado do Piranesi, a Igreja dos Cavaleiros de Malta no Aventino, em Roma. E' obviamente impossivel fotografa'-la bem, porque esta' escondida e nao se pode visitar. E' um dos cantos do cisne do barroco romano, mas espacialmente pouco mais é do que uma caixa simples com um telhado a duas aguas; ou seja, nada de extases espaciais borrominianos. Parece sim uma das gravuras do autor: estampada de baixos-relevos, bizarros e justapostos de um modo completamente nao otodoxo sobre as superficies lisas das paredes, como se estas fossem papel.
Em que é que isto entra com o tema? Pois bem, para mim isto é arquitectura, arquitectura como linguagem. E nao estou a dizer que arquitectura seja linguagem, porque acho, ao contrario das citaçoes do Tiago, que ela é feita de coisas fisicas, mas o que verdadeiramente a distingue de um pedaço de pedra ou de uma montanha é aquilo que ela diz, e no caso da arquitectura erudita aquilo que ela quer dizer e se o consegue e como. Por isso posso gostar de gente tao diversa como dos nossos Santos Padres da Escolinha e também deste tipo (a que alias devo esta ideia).
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5 de abril de 2005
nem de proposito
a Praça de S. Pedro antes da confusao actual, em que la' dormem pessoas e a fila para a camara ardente dura até às duas da manha, interrompida para limpezas até às cinco.
O Portoghesi escreve na Roma Barocca qualquer coisa do género: a genialidade da colunata é o tornar-se completamente transparente ou opaca conforme o ponto de vista.
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4 de abril de 2005
Os computadores e a arquitectura
Nos últimos tempos aconteceram-me dois episódios que me puseram a pensar nisto: um, um aperitivo com alguns professores da Universidade de Notre Dame, em Roma, em que um deles dizia “Podemos ter melhores computadores, mas não acho que tenhamos melhor arquitectura”. Outro, o fim-de-semana em Veneza em que este moço se pôs a testar frente a frente um mac e um pc.
1 • Computadores vs Canetas • A frase do senhor é inteligente, mas muito parcial. Eu, como escravo, prefiro arrastar linhas no Autocad que estar debruçado sobre o estirador. Nem sequer é uma questão de poupar tempo (acho que no fim de contas não se poupa grande coisa, a não ser que se trabalhe de um modo muito organizado), mas sim de poupar tempo a fazer fregnacce, coisas estúpidas como fazer as matrizes a lápis (já lá vão uns anos!) para depois passar a tinta, para depois passar a lâmina e emendar o que se errou e repetir o processo. Um desenho à mão tem mais expressão e sempre o terá, pelo menos em teoria, tal como um vinil tem sempre melhor som que um CD, em teoria. Mas na prática qual é a vantagem de dar uma expressividade maravilhosa a desenhos que vão ser vistos na obra? Depois pode-se sempre ter alguns desenhos feitos à mão (i.e. passados a tinta, com aguarelas, etc) se se quiser publicar e ter a melhor qualidade possível, mas parece-me que hoje em dia organizar o trabalho como há trinta anos atrás não tem lógica nenhuma, sobretudo quando quem tem que o executar, nós escravos, são pessoas para quem o computador é uma terceira mão.
2 • Mac vs PC • Aqui é que a porca torce o rabo. Eu uso, desde que arrumámos o Spectrum, computadores Macintosh, onde aliás escrevo este texto. São lindos e perfeitos, elegantes tanto por fora como no sistema operativo. Mas há pouco tempo descobri também que não só são lentos, como se estão a tornar cada vez mais inflexíveis e ditatoriais. Com os sistemas antigos (até ao 9) podia-se organizar ou desorganizar tudo como se quisesse, adicionar fontes, aplicações, etc sem grandes preocupações de coerência. De vez em quando havia uns erros de sistema (a mítica mensagem com a bomba) mas poucas vezes era alguma coisa grave. Agora, a política da Apple parece ser a de uniformizar tudo: vêem-se as fotos com o iPhoto, ouve-se música com o iTunes, and so on, tudo na maior coerência estética possível. O facto de que cada vez que ligo a máquina fotográfica ao computador tenha que esperar que o iPhoto carregue não importa; o facto de que o iPhoto seja lentíssimo também não importa – o que importa é que é tudo esteta ao limite da insuportabilidade, tudo irritantemente pré-definido por mim. Quando comecei a usar PCs em Itália e me apercebi que para fazer um simples slide show basta abrir a fotografia, sem esperar, foi como uma revelação. Tão simples! Sem programa nenhum! No tal fim-de-semana em Veneza, o mesmo moço acabou por desabafar: “Mas tu não compraste um Mac para ter o computador mais rápido, pois não?” Boa, compramos computadores para serem mais lentos. Os motivos invocados eram então que o sistema era mais estável (o que quer dizer que vai abaixo POUCAS vezes menos que os outros), que não havia vírus (o que quer dizer que não é preciso ter um vulgar anti-vírus) (aliás, também quer dizer que, se não há vírus, é porque ninguém usa os Macs...por muito que queira acreditar que o facto de o sistema operativo ser baseado em Unix o torna difícil de enganar) e que a próxima versão do Archicad vai ser mais rápida no Mac (neste momento é ao contrário). Ora, parece-me pouco, francamente. Eu sou do tempo em que os PCs tinham monitores CGA ou lá o que era que só mostravam 16 cores e com uma resolução de fazer inveja a um Gameboy. Eram chamados, pelos intelectuais abastados que podiam comprar Macs, (como eu) de “cafeteiras”, feitos de peças diferentes e anónimos, enquanto que “nós” tínhamos uma máquina com verdadeira personalidade. Esses tempos já lá vão, e ainda bem, porque mais pessoas podem ter um computador decente. A verdadeira fregatura, no entanto, fica para nós, arquitectos utilizadores de Macintosh. Porque “eles” podem escolher, enquanto que nós não – temos que nos conformar com programas de CAD terceiro-mundistas, como se usa em Londres porque os bons são caros demais. E aqui passamos ao próximo ponto:
3 • Archicad vs Autocad • Também sou do tempo em que um engenheiro veio lá a casa, estivemos a mostrar-lhe o Archicad no Mac e no fim ele disse “Isso é porreiro, mas acho que mesmo assim os outros são mais científicos.” HAHAHA grande labrego dissemos nós quando se foi embora. Pois, também são tempos que não voltam. Tudo o que o Archicad faz, o Autocad faz também, mas em metade do tempo. Mais uma vez, foi preciso vir para Itália para me dar conta de como era estúpido fazer desenhos em 2D no Archicad, e de como era rígido e limitativo no 3D. Basicamente, o Archicad é um programa antipático – parte do princípio que o utilizador não é muito inteligente e então não o deixa fazer muitas coisas. Isso não é simpático. E quanto a mim é também um princípio fascizante e totalitário; porque é que não posso fazer o projecto como me apetece, sem usar ângulos, materiais e objectos que alguém pré-definiu por mim? (essas coisas irritam-me profundamente).
O Autocad, pelo contrário, pode ter imensos defeitos (parece uma manta de retalhos, deselegante, com milhares de ícones e opçõezinhas e comandos que ao princípio não se sabe muito bem para que servem) mas basta um mês e já se é mais produtivo do que com qualquer outro – e com muito mais possibilidades de ter liberdade criativa. E não está disponível para Macintosh.
Um computador é uma ferramenta, como um martelo. Quando preciso de pregar dez mil pregos procuro comprar o martelo mais eficiente, não o mais bonito.
Sendo assim, anuncio que assim que me derem um salário decente vou chutar o Mac (perdoa-me!) para um canto escuro e comprar um PC. Pode ser que quando isso aconteça a história já seja outra.
posto pelo Alexandre às 18:16 1 comentários
1 de abril de 2005
so para que fique bem claro
Os blogs a que vou diariamente sao: o Abrupto (nem é preciso dizer nada, mas também so' vou pelo comentario politico. Ao principio ainda me esforçava por ler os poemas e contemplar as imagens, mas depois nao ha' paciencia); o Desesperada Esperança (que me faz ficar deprimido ou rir à gargalhada, logo nao aconselhado a visitas frequentes), o Picuinhas (agora morto, mas os posts do Picuinhas himself faziam-me chorar de tanto rir em Londres) e por ultimo, o meu preferido, A Blasfémia (muito especialmente tudo o que escreva o Joao Miranda - é simplesmente do melhor, no prisoners taken!).
Quanto aos amigos, o Whiskissos do Lobao com excelentes fotos a armar ao pingarelho e o narcisistico Allegro ma non troppo, cujo marmelo-em-chefe convido a escrever mais sobre politica para termos umas troacs de galhardetes à moda antiga.
Espero conseguir perceber este blogger e conseguir por estes endereços aqui ao lado.
posto pelo Alexandre às 14:43 1 comentários